A Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) deflagrou, nas primeiras horas da manhã desta quinta-feira (8), a Operação Amigos do Rei. A ação aconteceu nos municípios de Baixio (CE) e Teresina (PI), com o apoio do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), da Polícia Civil do Estado do Piauí (PCPI) e do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) do Ministério Público do Estado do Piauí (MPPI). A ofensiva teve como objetivo cumprir mandados de prisão preventiva e busca e apreensão domiciliar, em face de suspeitos de fraudar o concurso público da Prefeitura Municipal de Baixio, na Área Integrada de Segurança 21 (AIS 21) do Estado do Ceará, realizado em 2019. Todos os cinco alvos dos mandados, entre políticos e empresários, foram capturados.
Durante a operação, foram presos preventivamente o vereador Raimundo Amaurílio Araújo de Oliveira, o “Zico”, de 54 anos, que é presidente da Câmara Municipal de Baixio, e o ex-vereador Francisco Bernardo dos Santos, de 48 anos, ambos capturados no município cearense. Foram capturados no estado do Piauí, os irmãos Tiago Lima Iglesias Cabral, de 36 anos, sócio-administrador, e Diego Lima Iglesias Cabral, de 37 anos, funcionário de uma empresa que atua desde 1999 no segmento de concursos públicos e tem sede em Teresina. Com os suspeitos foram apreendidos aparelhos celulares e notebooks. O último alvo capturado é Dirceu Iglesias Cabral Filho, de 64 anos, pai de Tiago e Diego, preso no fim da tarde de hoje.
Os suspeitos são investigados por realizar um acordo ilícito com o objetivo de alterar o resultado do concurso público realizado em Baixio para beneficiar familiares e apadrinhados políticos dos vereadores envolvidos. Os suspeitos foram indiciados e denunciados pelos crimes de falsidade ideológica, associação criminosa, supressão de documento, fraude no caráter competitivo do procedimento licitatório, divulgação de conteúdo sigiloso de concurso público, usurpação de função pública, prevaricação e peculato. As medidas cautelares foram decretadas pela Comarca de Ipaumirim e cumpridas nas cidades de Baixio (CE) e Teresina (PI) com o apoio da Polícia Civil e do Ministério Público.
“A operação deflagrada na manhã de hoje, Amigos do Rei, expressão que indica privilégio, contrapondo a essência do concurso público e isonomia dos candidatos, foi expedida pela Comarca de Ipaumirim. A investigação foi encerrada e os autos remetidos ao Poder Judiciário. Além disso, o MPCE já ofereceu a denúncia dando início a fase processual”, ressaltou o delegado Fellipe Lira, titular da Delegacia Municipal de Ipaumirim, que esteve à frente das investigações do caso.
Entenda o caso
O Ministério Público apresentou a denúncia com base no inquérito civil e na investigação produzida pela Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE), apontando fortes indícios de fraude no resultado do concurso público, com comprovada participação dos denunciados. O esquema criminoso teve origem antes mesmo do lançamento do Edital 01/2019.
A quebra do sigilo de dados previamente autorizada judicialmente no aparelho celular de Dirceu Iglesias, sócio-administrador da empresa Consep, revelou que em novembro de 2018, Francisco Bernardo entrou em contato com o empresário, comparecendo à sede da empresa, em Teresina, no dia 18 de dezembro de 2018, evidenciando o direcionamento da contratação da empresa para realizar o certame, o que de fato ocorreu e foi descoberto com a quebra do sigilo telefônico.
Linha de investigação
A Polícia Civil iniciou as investigações com análise detalhada de cada candidato aprovado e constatando que 12 pessoas já possuíam vínculo com o município, alguns com cargos em comissão e outros contratados. Foi analisado ainda que quatros desses candidatos possuíam uma relação de parentesco com o então vereador Francisco Bernardo. Inclusive, a esposa, atual vereadora, o genro, o irmão do genro e um sobrinho.
As investigações apontaram também que dois desses aprovados possuíam uma relação familiar com Raimundo Amaurílio, o “Zico”. O que chamou atenção nas investigações foi o fato desses três candidatos serem de Porteiras, município de nascimento de Francisco Bernardo. Diante dos fatos, a PC-CE representou uma medida cautelar de busca e apreensão na sede da empresa organizadora do concurso e na Secretaria de Administração do Município de Baixio.
“Para nossa surpresa, os cartões-resposta não foram encontrados (na sede da empresa). Foi encontrada uma suposta relação de classificação divergente ao da empresa organizadora do concurso. Diante da materialidade da fraude, passamos para outras etapas da investigação. Descobrimos que houve uma reunião com Bernardo. Ele esteve na sede da empresa para trocar cartões e favorecer candidatos. Concluímos, com a extração de dados, que houve um acordo ilícito com o objetivo de burlar e fraudar o resultado final do concurso beneficiando pessoas ligadas aos vereadores investigados”, explica o delegado.
Segundo os levantamentos da investigação do caso, a empresa organizadora do concurso já realizou cerca de 208 concursos públicos, sendo sete no Ceará, nas cidades de Baixio, Barro, Porteiras, Pacajus, Paracuru, Camocim e Tauá. A Polícia Civil investiga se ocorreram outras fraudes similares na realização de concursos no Ceará. Os cinco suspeitos capturados na Operação Amigos do Rei estão presos e à disposição da Justiça.
Atuação do Ministério Público
“A quebra de sigilo do aparelho telefônico confirmou a fraude. A empresa é uma associação criminosa voltada para a fraude em concursos públicos. Os diálogos revelaram ainda a atuação dos criminosos na fraude do concurso. Além disso, ingressamos com uma Ação Civil Pública (ACP) para anular o concurso e exonerar os nomeados. O Ministério Público requer à Justiça o imediato afastamento de todos os servidores efetivos nomeados por meio do concurso fraudado, bem como a anulação definitiva do certame, com a consequente exoneração de todos os nomeados. As condutas de improbidade administrativa também são objeto de investigação do Ministério Público”, revelou João Eudes Lins, promotor do MPCE, titular da Promotoria de Lavras da Mangabeira e responsável pela Promotoria de Baixio.
O Ministério Público do Ceará denunciou Raimundo Amaurílio Araújo Oliveira pelos crimes de falsidade ideológica qualificada em continuidade delitiva, fraudes em certames de interesse público qualificado, peculato, prevaricação, advocacia administrativa e usurpação de função pública qualificada. Francisco Bernardo dos Santos foi denunciado pelos delitos de frustração do caráter competitivo de licitação, falsidade ideológica qualificada em continuidade delitiva, supressão de documento público, fraudes em certames de interesse público qualificado e usurpação de função pública qualificada.
Os suspeitos Dirceu Iglesias Cabral Filho, Tiago Lima Iglesias Cabral e Diego Lima Iglesias Cabral foram denunciados por associação criminosa, falsidade ideológica qualificada em continuidade delitiva, supressão de documento público e fraudes em certames de interesse público qualificado. O Ministério Público também denunciou Dirceu Iglesias Cabral Filho por frustração do caráter competitivo de licitação.